
Em 2019, o NOS Primavera Sound regressa ao Parque da Cidade, no Porto, entre 6 e 8 de Junho.
É rara a percepção imediata de que se está a viver um momento único, de que se está a criar uma daquelas memórias que vão perdurar até ao final dos dias. Um daqueles suspiros que fazem arrepiar, sonhar, emocionar. Às vezes, para descrever um concerto de Nick Cave, permanece a sensação de que todos os adjectivos são inócuos – ou, porventura, insuficientes. O que Cave faz quando sobe ao palco, quando se debruça sobre o seu público, quando o abraça (tanto com a sua voz quanto com a sua presença e o seu olhar), é um misto de celebração religiosa, daquelas que lava a alma em toda a sua escura plenitude, com uma verdadeira lição de música. Em última análise, é isto que se pretende atingir com qualquer forma de arte – atingir a proeza de tornar íntima uma multidão de dezenas de milhar, colocar em silêncio ensurdecedor um (incrível) anfiteatro natural, encharcado pela teimosa chuva mas devoto a um cavalheiro cujas palavras se tornam reflexo da nossa existência. É assim Nick Cave, o magnífico, o eterno. É assim quando se escutam os primeiros acordes de “Jesus Alone”, que dá o mote a Skeleton Tree e também ao regresso do australiano e dos seus Bad Seeds ao NOS Primavera Sound. É assim quando todos se entregam aos espasmos de rock de “Jubilee Street”, da mesma forma que é assim quando, milhares de braços se dirigem ao céu para acompanhar a despedida, com o palco a encher-se de elementos do público para entoar um desarmante “Push The Sky Away”. “É bonita esta chuva”, havia Cave de dizer. É bonita esta música, havia de responder o seu público, das serenatas de “Do You Love Me” ou “Into My Arms” às descargas de “Tupelo”, “Weeping Song” ou “Stanger Lee”. É incrível o deleite dos concertos de Nick Cave, passem os anos, acumulem-se as experiências, em sala fechada com pequenos públicos ou debaixo de chuva num palco enorme – Cave será sempre maior do que qualquer palco. Cada mão que sentiu as suas, cada investida sobre o seu público, foi como se tivesse tocado a todos. No dia seguinte, a roupa secou, a chuva foi esquecida mas as memórias de Nick Cave vão perdurar para sempre. É mesmo verdade, todos os adjectivos parecem inócuos para falar de Nick Cave – porque a arte, quando em estado de perfeição, não é para ser falada. É para ser vivida.
Ao longo dos três dias de NOS Primavera Sound, passaram cerca de 30 mil pessoas pelo Parque da Cidade, no Porto, ao qual o festival regressará, em 2019, entre os dias 6 e 8 de Junho.
Foto: Hugo Lima/NPS