Ao longo de três noites, viveu-se a liberdade – de género, de estilo, de ritmo. O MEO Kalorama regressa ao Parque da Bela Vista em 2025.
Se fosse preciso escolher uma palavra para descrever a terceira edição do MEO Kalorama, essa seria, certamente, liberdade. Ora então, vejamos: num festival que tem como pilares a Música, a Arte e a Sustentabilidade, fundiram-se estilos e abraçaram-se diferenças; viajou-se no tempo sempre com os olhos postos no futuro; mergulhou-se na opressão mas reagiu-se de braços no ar, com a lua como bola de espelhos e o pó a confundir-se com o chão de uma imensa pista de dança. Não é à toa que se diz que a pista de dança é o supremo símbolo de liberdade.
Mas que liberdade é esta? É a que Burna Boy, o embaixador da música nigeriana actual, traz no seu afro-fusion, que extrapola – em muito – o mais tradicional afro-beat. Mas também é o “My 21st Century Blues” de Raye, o álbum que marcou a estreia da britânica em Portugal mas que de “blues” traz apenas a palavra. Se Raye é soul e r&b, Ana Moura pode ser o que ela quiser, do fado que carrega sempre na voz à África que lhe corre nas veias… E, repare-se, estes são apenas três exemplos do cartaz do terceiro dia do MEO Kalorama.
Depois da festa leve e solta dos Gossip – que conseguiram trazer “Smells Like Teen Spirit” para o seu “Standing in the Way of Control” –, o primeiro serão da terceira edição do festival havia de ficar marcado pela antítese dos seus cabeças de cartaz: onde a actuação dos Massive Attack se tornou opressiva pelo cerimonial acusatório das lutas em Gaza ou na Ucrânia, Sam Smith encheu o palco de cor e, mesmo sem purpurinas, todos acreditámos que, um dia, podemos ser quem quisermos ser, dançar como quisermos dançar, amar quem quisermos amar. A mensagem, de certa forma, é a mesma – mudam-se, apenas, os mensageiros e o seu formato.
Já no caldeirão oferecido pelo chef James Murphy, a liberdade é outra: é aquela que não tem pudor em fazer emigrar o techno de Detroit para Nova Iorque, apenas para tatuá-lo de electro, de punk, de glam, metê-lo na mala e levá-lo a correr mundo. Assim eram os LCD Soundsystem há 20 anos e assim são agora: mais velhos? Sim, claro, mas com o mesmo vigor, a mesma intensidade de ritmo, a mesma sede de, lá está, liberdade. A tal que faz com que o rock dos Kills continue a fazer-nos sangrar a alma e sorrir o coração. Ou a outra, a que nos faz crer que se o Studio 54 nascesse em 2024, em Londres, os Jungle – com o seu nu-disco – seriam os artistas residentes.
Podemos e queremos ser todos diferentes mas há algo ímpar quando nos sentimos iguais, sinal de uma pertença que só se encontra no tal templo da liberdade a que chamamos pista de dança. No MEO Kalorama dançámos como se aqueles três dias se pudessem tornar uma vida inteira. Pode ter sido um sonho mas, por agora, o sonho ainda não tem preço.