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Márcia: “Sou muito solitária a fazer música”.

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A solidão pode ser um lugar feliz: é assim que nasce a obra de Márcia, naquele espaço único onde a criação se torna um processo de auto-conhecimento. Ao falar de si, fala aos outros – e é aí que está a sua grande cura.

 

Em Portugal, figuras como Márcia são raras. Ou melhor, figuras como Márcia são raras. Ponto final. (Mesmo que, no início da sua carreira, a quantidade de “homónimas” a surgir na internet tenha levado o Professor Marcelo a elogiar Márcia, “uma cantora brasileira”). Ao criar uma obra profundamente íntima, onde vai narrando o seu crescimento, as suas experiências, as suas aprendizagens, as suas canções vão documentando a sua vida, desenhando os contornos da sua existência. Ao fazê-lo, da perspectiva da total honestidade, acaba por oferecer, a quem a ouve, as ferramentas para muitas outras vidas. E, assim, a sua deliberada solidão encontra companhia. E acompanha.

Márcia estava predestinada a ser música – mesmo que não o soubesse ou que “teimasse” em não colocar a música no centro da sua existência. As canções estavam sempre “lá”: dos tempos de menina em que as sestas dos pais eram uma desculpa para se entreter com o “Calhambeque” de Roberto Carlos ou quando as viagens semanais ao Mercado de Alvalade deram azo à compra do seu primeiro instrumento. Uma quarentena leva-a a tornar o isolamento forçado numa panóplia de canções; um grupo de amigos encaminha-a à primeira banda; o pai de uma amiga dá-lhe a oportunidade de gravar o primeiro álbum. Para trás, ficava não só o estudo de pintura mas também o sonho de se tornar documentarista. Porém, o que fez desde que se estreou com Dá, aplica todos os seus conhecimentos académicos: cada canção de Márcia é mais do que uma canção. É uma tela em forma de música, onde são documentadas as suas observações, as suas vivências. Foi assim com Casulo, continuou a ser assim com Quarto Crescente e não podia ser de outra forma em Vai e Vem, o seu quarto álbum, editado em 2018. Na solidão boa da qual brotam as canções de Márcia, encontram-se os lugares onde se expiam os fantasmas, mesmo aqueles que não se sabia, antes, que existiam. É essa a sua grande cura e é isso, acima de tudo e antes de mais nada, que torna uma figura como a de Márcia, única. Ponto final.

Ana Ventura Ana Teresa Ventura trabalhou na Blitz durante dez anos e hoje podemos vê-la tanto em festivais de verão cobertos pela SIC, como na sua rubrica, M de Música do programa Mais Mulher, na SIC Mulher.

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