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Nick Cave & The Bad Seeds Ghosteen

Nick Cave & The Bad Seeds Ghosteen
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Num álbum repleto de tristeza, é possível encontrar beleza e esperança na mais cruel das realidades. Assim prega Cave.

Quando se chega ao 17º álbum de uma carreira pontuada por momentos incríveis, podiam esperar-se repetições de fórmulas, regressos a premissas do passado, reencontros com mensagens de outros tempos, melódicas ou temáticas. Porém, nada disto é válido para Nick Cave e para os seus Bad Seeds. Aliás, esta tem sido uma cavalgada inesperada, tão inesperada para o artista quanto os eventos recentes na vida do homem. Porque é de humanidade que os três últimos longa-duração de Nick Cave têm falado, do amor de Push The Sky Away à dor de Skeleton Tree à esperança de Ghosteen. Se, no primeiro, Cave reflectia sobre a sua relação, no segundo, tentava lidar com a dor da perda de um filho e, em Ghosteen, procura a esperança que permita continuar. Continuar a respirar, continuar a viver, continuar a amar.

Em última análise, é disso que trata Ghosteen: de vida e de amor. Em todas as suas mais tortuosas respirações. Mas é uma vida que surge como resposta à morte. A vida que é a esperança depois da morte. Ou como a morte não tem que ser um final mas um passo, um encontro de uma nova existência, de uma nova forma de amar, onde o amor não se finda na última expiração mas se perpetua. Na existência de quem vive. De quem tem que continuar a viver.

É tentador sentir as canções de Ghosteen como densas, pesadas, escuras mas, no meio das palavras – tão depressa faladas como entoadas sem cuidar a tons ou afinações – há uma luz monumental, que dispara uma imensidão de cores tão doces quanto as que estão reflectidas na capa do disco. Sendo o primeiro álbum composto, integralmente, após a morte de um dos seus filhos, em 2015, ao invés de Skeleton Tree – onde parecia não haver espaço para nada mais a não ser um negro imenso –, Ghosteen é um disco cheio de declarações humanas. Daquela humanidade que faz acreditar num futuro, daquela humanidade que está assente onde toda a humanidade deve estar. No amor. Por isso, no meio de dissertações apontadas aos seus pais ou aos seus filhos, a si ou ao mundo, etéreas ou concretas, abre-se o peito para se dizer “i love you”, para se confessar que “sometimes, it’s better not to say anything at all”, para a redenção de “i say goodbye to all that, as the future rolls in”, para desabafar que “i’ll be waiting for you” ou para se assumir que “peace will come”.

Ghosteen é excelso, sublime, verdadeiramente transcendente. Nos ambientes, nas orquestrações, nas palavras, nas emoções. “There’s nothing more valuable than love”. Nick Cave deixou de ser um (mero) autor e tornou-se uma verdadeira religião.

Ana Ventura Ana Teresa Ventura trabalhou na Blitz durante dez anos e hoje podemos vê-la tanto em festivais de verão cobertos pela SIC, como na sua rubrica, M de Música do programa Mais Mulher, na SIC Mulher.

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